quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Outro poema do livro "Fuga pela claraboia"


POLISSÍNDETO DO INVERNO EM BRASÍLIA

É inverno
e manhãs são frias
e bichinhos aprendem a voar
e vento traz saudades insólitas
depois que ficamos sozinhos
e no céu ainda pipas
como crianças que brincam.
Dormimos até tarde
e fazemos poesia
e somos lembrados
como os blusões de lã
e ainda cheiro de comida quente
e best-seller quentíssimo
depois de espreguiçar a poltrona.
O charuto é lembrado
e cartas esperam respostas;
postais da catedral para quem?
e sem pressa, revemos fotos
enquanto formiguinhas vigiam o chá
e telhas úmidas carreiam neblina.
Há canções calmas
e sem sermos doentes
fingimos carência
e vemos avezinhas orvalhadas
e filmes de neves de natais estrangeiros;
pela casa, réplicas – acho – de Lautrec
e as peças de xadrez sem estrategistas.

domingo, 9 de outubro de 2011

RESPOSTAS AO QUESTIONÁRIO A MIM DIRIGIDO POR POLLIANA


Freitas, como um de seus livros vai cair no vestibular da URCA, queria saber:

1)             Qual seu estilo?
Em minha poesia como um todo (considerados os quatro livros publicados e os inéditos), não consigo definir um estilo que a caracterize definitivamente (talvez a falta de um estilo determinado seja sua marca) e prefiro vê-la como poesia típica do ecletismo pós-moderno, mas um outro (um crítico vendo-a com o discernimento próprio do que olha de fora) possa-a melhor identificar nela um estilo que eu, com autor (de tão de dentro que a observo), não consigo enxergar.
Em Fuga pela claraboia em particular, (diferentemente de Nacos, cujo estilo formal de poesia visual é a marca principal) o estilo da poesia versificada sem rima e sem métrica de gosto mais jovial ocorre predominantemente. Não há uma temática rígida a não ser a inquietação poética do olhar inventivo do poeta no cotidiano das gentes.

2)             Sua inspiração?
Em fuga pela clarabóia aparecem poemas com diversas temáticas e de motivos diversos. Não há uma inspiração única (como o sertão reinventado de Ave, sertão!), mas uma coleção de poemas reunidos pelo pretenso desejo de constituir um livro leve e de leitura ao gosto de um público jovem.

3)             Você segue alguma corrente?
Não. Correntes prendem e, como já dizia Belchior, “não vou eu mesmo atar minha mão”... prefiro estar à vontade para seguir aonde levar a poesia.

4)             Quais são as principais características notadas em seus poemas ou escritos?
Falando exclusivamente de Fuga pela claraboia, quanto à forma a principal característica é a não adoção de forma fixas de poemas e o, como já dito, o uso de versos sem rima e sem métrica, mas organizados conforme o ritmo ou em função da expressividade poética; quanto ao conteúdo, é caro para mim o ser humano em seu interior conflituoso e em seu exterior processual.

5)             Como poderíamos analisá-los?
Analisar poesia é tarefa complexa, porque poesia é mais pra ser sentida do que pra ser entendida ou compreendida. Isso quer dizer que, nessa tarefa, entram componentes individuais, vivenciais, mas também conhecimentos estéticos... ou seja, para se analisar poesia, tem-se de ter “leituras” que vão além das leituras poéticas... de qualquer forma, indico, como exemplos de análises e estudos da minha poesia, os prefácios dos quatro livros (em Fuga pela claraboia, o prefácio é de Íris Tavares), uma monografia sobre minha produção poética de autoria de Ana Cristina S. Prado e um artigo do professor Flávio Queiróz publicado no livro “As veredas da pesquisa em Letras: ensaios críticos e teóricos”.

Grata,
Polliana.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Fuga pela claraboia é meu segundo livro de poesia e foi publicado em 1997. Produção independente. Capa de Karimai, ilustrações de Fidel Charlie e apresentação de Íris Tavares.

ROL DOS MOTES

Se um raio não cai nunca
duas vezes no mesmo lugar,
por que não fazem para-raios descartáveis?
Dê-me um ponto no céu
e eu ponho uma quitanda.
O inglês é a língua universal
dos ianomâmis.
Aqui tudo se plantando dá
lá fora.
A indústria da seca
já foi privatizada?
Oh! Que saudades que tenho da Aurora
empregada de mamãe.
O poeta é um fingidor
como todo mundo.
A AIDS mata
menos que o medo de admiti-la.
A inflação vai cair
matando a pau.
De médico e louco
todo mundo corre às léguas.
                                 (In: Fuga pela claraboia)

Nacos - poesia visual (com coautoria de Hermano Roldão)

Ave, sertão!

Curta versagem

Capas dos outros livros de poesia de minha autoria

Na sequência, aparecem as capas dos meus livros de poesia

A TARDE (In: Fuga pela claraboia)

A tarde invade
os olhos como se fosse dona dos sentidos...
Avassaladora,
a tarde confia na imensidão
como se possuísse força sobrenatural.
Ela cura sua ressaca,
após sua lúbrica passagem,
atiçando tanta dor e saudade...

A torre mais alta da cidade
acena ao sol poente.

O olhar indiferente da tarde
tem a penetração
do olhar furtivo
das crianças deusas
indianas.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Um poema de Fuga pela Claraboia


LANTERNA AZUL

Mas se o maquinista fosse daltônico
a locomotiva teria parado.
(Felipe de Oliveira, 1891 – 1933)

O frio da noite densa
abria o escuro com pedacinhos de água...

Alguns meninos
distraídos do mundo
e brincando com lanterninhas
pousaram luzes detrás dos flocos de neve...

Talvez míope, talvez encantado,
o maquinista deteve o trem
e creu ver vaga-lumes azuis
ou era nova lanterna de estranho semáforo...

E, na estação adiante,
passageiros reclamavam o insólito atraso.